Poema: A florista (ou Hortênsia, a flor azul)
"A cultura japonesa diz que as flores azuis representam
gratidão, admiração, amor e respeito."
Nessa loja despercebida por todos, havia uma bela florista.
Ela sempre trabalhava sorrindo.
Ela era mais uma flor no meio de todas aquelas outras.
Seu cheiro se misturava com a das flores.
Fazia inveja para orquídeas, girassóis e violetas.
E toda as vezes que eu passava na rua dessa floricultura, estacionava meu carro.
Entrava na loja, inventava uma desculpa para comprar uma flor somente para poder falar com ela, mas ela sabia daquela mentira toda.
Por entre as prateleiras meus olhos procuravam pelos seus olhos.
Aqueles seus olhos azuis possuíam magnetismo.
Ela sorria das minhas atrapalhadas intenções com aqueles seus lábios de pétalas.
A semente do amor estava sendo plantada.
Depois daquele dia, minha vida se dividiu entre trabalho e passeio de mãos dadas.
Eu e a florista passávamos o dia olhando as nuvens.
E em menos de um ano, havia casado com todas aquelas flores.
Todos os dias eram os melhores dias das nossas vidas.
Estava guardando para um momento especial, entregar para ela uma flor azul chamada Hortênsia.
Ela vivia dizendo que amava essas flores, que são nativas da China e do Japão.
Flores que são da mesma cor dos seus lindos olhos.
...
..
Só que existe uma fatalidade nas flores, elas murcham fora da terra.
As flores de plástico não possuem a mesma essência de finitude que as suas irmãs naturais.
E a florista sofreu com uma grave doença.
Que lhe murchou por dentro e por fora.
Retirando dela seu sorriso.
Uma ironia da vida.
Durante os noventa dias que ela ficou internada.
Levei a cada dia uma de suas amigas, uma daquelas flores.
A doença levou parte do seu brilho, parte de sua vida.
O destino queria levar tudo o que eu havia cultivado, deixando o jardineiro sozinho.
No último dia, esperando por uma melhora no seu quadro de saúde.
Levei a Hortênsia.
Esperando que a flor virasse o símbolo de uma recuperação.
Quando entrei no quarto do hospital.
Os olhos daquela flor murcha na cama do hospital se encheram de água.
E eu pude ver aquele lindo sorriso dela novamente.
Era uma despedida.
Depois de entregar a flor, beijei a sua testa massacrada pela doença.
Passei a noite toda segurando suas mãos.
Peguei no sono ao seu lado.
Quando acordei.
Ela já estava morta.
Ela morreu sorrindo e com os olhos fechados.
Uma das mãos estava segurando a minha mão e a outra a Hortênsia.
...
..
Para lhe homenagear.
Construí um santuário de Hortênsia no lugar daquela antiga loja de flores que ela trabalhava.
Distribuí para cada um dos moradores daquele bairro uma muda dessa flor.
Depois, disso o bairro ficou conhecido como o bairro “da flores azuis”.
E todos puderam ver, a partir disso, a beleza que só você conhecia nas Hortênsias.
E por todo o bairro um pedacinho de você se eternizou na paisagem local.
(Gabriel Araújo)